Por que o caso Americanas fez clientes do Nubank perderem dinheiro?
17, janeiro 2023
Rentabilidade negativa veio após os escândalos contábeis reportados pela varejista na última semana; carteira não foi a única impactada. Escritório da fintech brasileira Nubank
Divulgação/Nubank
Os efeitos das “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões encontradas no balanço da Americanas não influenciaram apenas os acionistas da empresa. Fundos de renda fixa com investimentos em crédito privado — e que investiam em debêntures (títulos de dívida) da varejista — apresentaram um forte recuo de rentabilidade.
É o caso do “Nu Reserva Imediata”, do Nubank. O fundo tinha aplicação mínima de R$ 1 e era apresentado pela instituição como sendo de “baixo risco e alta liquidez”, e indicado para “investidores que não querem correr muitos riscos e com uma expectativa de retorno melhor que o da poupança”.
As variações do fundo, que conta com mais de 1,2 milhão de cotistas e é o maior do tipo no Brasil, assustaram os investidores. Nas redes sociais, foram várias as publicações com reclamações ou alertas.
Por que a rentabilidade caiu?
Segundo os últimos dados apresentados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a carteira do “Nu Reserva Imediata” tinha cerca de 1% de seu patrimônio alocada em duas debêntures da Americanas. A crise reduz o preço desse título de dívida no mercado e “come” o patrimônio do cotista.
Assim, a carteira, que antes entregava ganhos equivalentes a 109% do CDI (certificado de depósito interbancário, principal referência de rentabilidade para investimentos em renda fixa), chegaram a um retorno de 37% do CDI nos últimos 30 dias.
Pior: o fundo é uma das opções oferecidas pelo banco para guardar dinheiro para uma reserva de emergência por meio de suas “Caixinhas” (ferramenta para que o cliente consiga organizar as finanças e guardar dinheiro de acordo com seus objetivos).
Especialistas não recomendam fundos de crédito privado para reserva de emergência, pois eles podem ter variação negativa e gerar perda para o investidor em momento que ele precise do dinheiro.
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Onde colocar a reserva de emergência?
Apesar de o “Nu Reserve Imediata” ser uma das opções, o banco reforçou, em nota, que a sugestão padrão do aplicativo para os clientes que criaram uma Caixinha como “Reserva de Emergência” é o investimento em RDBs (Recibos de Depósitos Bancários) do Nubank, também com alta liquidez e grau de investimento.
Especialistas, contudo, recomendam outras opções. A principal é o Tesouro Selic, que acompanha a rentabilidade próxima à taxa básica de juros do país. São títulos pós-fixados e que não estão sujeitos aos solavancos do mercado, além de contarem com baixíssimo risco e terem liquidez diária (permitem resgate a qualquer momento).
Entram na conta também os CDBs de grandes bancos e que reúnem as mesmas características do Tesouro Selic (pós-fixados e liquidez diária). Por fim, estão fundos DI de títulos pós-fixados e baixa taxa de administração.
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O que diz o Nubank?
Em nota, a gestora de investimentos do Nubank, a Nu Asset Management, afirmou que o fundo de renda fixa “Nu Reserva Imediata” possui uma estratégia desenhada para ser uma opção de baixo risco e “altíssima liquidez” e busca um desempenho acima do CDI ao longo do tempo.
A gestora ainda destacou que a carteira possui um retorno nominal (sem descontar a inflação) positivo de 2,72% nos últimos 90 dias e “segue trajetória de rentabilidade de longo prazo, apoiada pela diversificação de investimentos”.
“Assim como dezenas de fundos no mercado com o mesmo perfil, o Nu Reserva Imediata também investe em ativos de crédito privado, dentro de um limite regulatório. A pequena parcela de investimento em debêntures das Lojas Americanas, historicamente avaliada como Triple A [classificação de risco de crédito] por diferentes casas de rating, já foi revista pela Nu Asset Management”, completou a gestora em nota oficial.
Já sobre as “Caixinhas”, o Nubank afirmou que oferece diferentes opções de investimentos. “Cerca de 10% das Caixinhas existentes têm recursos no Nu Reserva Imediata. O impacto de rentabilidade nesse fundo específico, causado pelo evento atípico de mercado, tende a ser amenizado ao longo do tempo pela estratégia de gestão do fundo”, informou em nota.
Mas o fundo do Nubank poderia aplicar em ativos como esse?
Segundo as lâminas (documento que resume as principais características da carteira) enviadas à CVM, os fundos têm permissões para aplicar os recursos em crédito privado até um determinado limite do patrimônio.
No Nu Reserva Imediata Master, por exemplo, o limite do fundo para aplicações desse tipo era de 50%. Segundo documentos datados de dezembro de 2022, no entanto, apenas cerca de 27% da carteira estava investida em títulos de crédito privado.
Para encontrar esses documentos, o cliente pode acessar a aba “Fundos de Investimentos” no site da CVM e clicar em “fundos registrados”. A busca pode ser feita com parte do nome do fundo, da instituição administradora ou com o CNPJ de um deles.
O que aconteceu com a Americanas?
O movimento acompanha a desvalorização dos ativos da Americanas após a empresa informar a renúncia do presidente, Sergio Rial, e do diretor de relações com investidores, André Covre por conta da descoberta de “inconsistências em lançamentos contábeis” no valor de R$ 20 bilhões, na última quarta-feira (11).
Um dos desdobramentos mais recentes aconteceu na sexta-feira (13), quando o juiz Paulo Stefan, da 4ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro, acolheu o pedido de Tutela de Urgência Cautelar por parte da Americanas.
De acordo com o documento judicial, o montante de dívidas da companhia pode chegar a R$ 40 bilhões. Segundo especialistas, a possibilidade de a empresa entrar em recuperação judicial ainda não é descartada.
Os fundos do Nubank foram os únicos afetados?
As carteiras do Nubank não foram as únicas a apresentar oscilações negativas na última semana. Segundo especialistas, vários fundos e investidores que tinham dinheiro nos ativos da Americanas – seja em debêntures ou em ações, por exemplo – já sentiram o baque e começaram a realocar esses recursos.
Em entrevista feita ao g1, o responsável pela área de renda variável da SVN Investimentos, André Luzbel, afirmou que foram várias as ordens de venda feitas na última quinta-feira (12), refletindo as notícias sobre as “inconsistências contábeis”.
“Automaticamente tivemos vários fundos de investimentos zerando posições. Tivemos boa parte do fluxo de venda nos últimos dias e ainda tem muito fundo com posição maior [mais dinheiro alocado na Americanas] e que deve tentar vender esses ativos ao longo do tempo para tentar melhorar um pouco do preço. Isso é natural”, afirmou.
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Fonte: G1