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Meta da inflação: mudança após críticas de Lula ao BC divide opiniões de agentes do mercado

16, fevereiro 2023

Economistas influentes se mostraram favoráveis a uma eventual mudança na meta da inflação brasileira. Para o presidente da República, mirar em uma inflação tão baixa impede a queda dos juros e atrapalha o crescimento do país. Roberto Campos Neto e Lula: para especialistas, a melhora da comunicação poderia acalmar os ânimos
Reuters/Arte g1
Em evento nesta quarta-feira (15), três economistas que são referência no mercado financeiro se mostraram favoráveis a uma eventual mudança na meta da inflação brasileira.
Rogério Xavier, da SPX Capital, Luís Stuhlberger, da Verde Asset Management, e André Jakurski, da gestora JGP, deram peso ao time de analistas que concordam que um aumento da meta seria necessário para um avanço da economia brasileira.
Xavier afirmou, por exemplo, que “a nossa meta está errada” e que ela é “inalcançável”, em evento que contou com a presença do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT).
A tese é defendida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que acendeu esse debate em meio a um conjunto de críticas ao Banco Central do Brasil e ao presidente da instituição, Roberto Campos Neto. As discussões estão centradas justamente na taxa básica de juros, que está em 13,75% ao ano, patamar que o governo considera muito alto. (Entenda aqui a briga)
O Banco Central é obrigado a colocar a inflação brasileira dentro do intervalo da meta, usando a taxa Selic para isso. Para Lula, mirar em uma inflação tão baixa impede a queda dos juros e atrapalha o crescimento do país. O presidente pede, então, que a meta seja mais alta e mais adequada à realidade brasileira.
Nos últimos dias, chefes de grandes gestoras de investimentos endossaram a tese de Lula, que a meta central da inflação, fixada em 3,25% para 2023, seria baixa demais. Não custa lembrar: a meta é considerada formalmente cumprida se oscilar entre 1,75% e 4,75%.
Até então, porém, os agentes do mercado eram refratários às discussões sobre a elevação da meta da inflação, definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). O g1, então, perguntou a economistas o que mudou.
Por que não se falava no assunto?
Para o ex-presidente do BC Gustavo Loyola, apesar de nomes relevantes do mercado financeiro se alinharem ao discurso de Lula, não significa que haja uma voz única entre os agentes. Diretor-presidente da Tendências Consultoria, ele afirma ser um dos economistas contrários à mudança.
“Continuo insistindo que é um erro alterar a meta. Vai dar uma sinalização muito ruim. Será mais difícil para o Banco Central conduzir a política monetária. Isso porque a expectativa de inflação vai para cima, o que traz impactos negativos, diz.
O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, afirma que o assunto já era debatido pelo mercado, com posições favoráveis e contrárias. A diferença é que, agora, o tema ganhou os holofotes por conta das declarações de Lula.
“Parece que economistas e agentes do mercado financeiro sempre ficaram em silêncio em relação às metas da inflação, e agora que o presidente deu destaque ao assunto eles começaram a dar opinião. Mas não é bem assim. Essas conversas já ocorrem internamente e em fóruns. Acontece que, quando vem de um chefe de Estado, a repercussão é muito maior”, diz.
O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega segue a mesma linha. Para ele, são convicções já construídas pelos agentes do mercado e, portanto, natural que agora se manifestem sobre o tema após as declarações de Lula.
Alteração da meta divide opiniões
Apesar de considerar legítimo o debate, Maílson diz não ser o momento ideal para se discutir o tema. “A mudança da meta nesse ambiente de turbulência, de ataques ao Banco Central – enquanto é preciso definir um arcabouço fiscal – é a medida errada no momento errado”, diz.
“O aumento da meta para inflação deve alterar expectativas. Os agentes econômicos vão migrar suas projeções rapidamente para a nova meta. Isso vai exigir que o BC aumente a Selic, porque a taxa de juros vai ter que subir. É um efeito contrario. Um tiro no pé”, afirma.
Para Gustavo Loyola, o sistema que compõe a meta de juros “funciona muito bem”, e o formato em prática tem dado resultado.
“É melhor cuidar da questão fiscal, que está um caos. É preciso estruturar reformas. Todos os dias você vê o governo anunciando aumento de gastos. Cada dia uma notícia nova. Não se trata apenas da causa monetária”, afirma o ex-presidente do BC.
Do lado contrário, o economista Antonio Corrêa de Lacerda, conselheiro e ex-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), considera a alteração uma medida positiva. Para ele, o tema divide opiniões do mercado por “desconhecimento” de teorias, das melhores práticas internacionais e por “interesses”.
“A meta atual é irrealista, considerando a situação atual de pressões de oferta. Mesmo para países desenvolvidos, nossa meta seria apertada demais”, compara.
Lacerda afirma que é preciso estudar as causas, o núcleo da inflação e estipular uma meta “realizável”. Para ele, hoje o ideal seria algo próximo de 4%, com margem de 2 pontos percentuais.
O economista é signatário de um manifesto assinado por mais de 3,6 mil economistas contra a alta da Selic. O documento diz que “a taxa de juros no Brasil tem sido mantida exageradamente elevada pelo Banco Central e está hoje em níveis inaceitáveis”.
Alex Agostini, da Austin Rating, também considera o modelo atual inviável. Ele defende, entretanto, a mudança estrutural no sistema de metas, e não apenas redefinição da meta – o que exige tempo de aplicação.
Uma das alterações sugeridas por Agostini é a mudança da meta anual (ano-calendário) para uma também fixa, mas de longo prazo, como a dos Estados Unidos.
“Se historicamente temos juros elevados, o problema está no sistema de metas. E, considerando toda a estrutura macroeconômica, aliado ao ganho de produtividade, de escala, então não poderíamos ter uma meta tão ambiciosa como nós temos”, conclui.

Fonte: G1