Publicidade

Golpe das criptomoedas: entenda por que ganhar 5% ao mês em investimentos é quase impossível

14, março 2023

Títulos de renda fixa estão muito distantes de uma rentabilidade que chegue perto daquela que foi prometida pelos golpistas, enquanto pelo investimento em ativos de renda variável não é possível garantir o lucro das aplicações. O meia Gustavo Scarpa e o atacante Willian comemoram gol do Palmeiras contra o Ceará em partida do Campeonato Brasileiro de 2020
Cesar Greco/Agência Palmeiras
Com apenas uma informação, os jogadores do Palmeiras que tiveram prejuízo milionário ao investirem em uma empresa de criptomoedas poderiam ter evitado a dor de cabeça: a promessa de lucro de 5% ao mês, garantida em contrato, está completamente fora da realidade dos principais produtos financeiros disponíveis no mercado.
Conforme o Fantástico mostrou com exclusividade neste domingo (12), o meia Gustavo Scarpa (atualmente no Nottingham Forest FC) investiu R$ 6,3 milhões em criptomoedas, em uma aplicação indicada por Willian Bigode (atualmente no Fluminense). Um lucro de 5% ao mês seria o equivalente a quase 80% ao ano — quase seis vezes mais do que a taxa Selic, que é referência para os juros no país.
“Quando a gente fala de investimentos, tudo que vai acima da taxa Selic começa a ter risco. Quanto maior é a rentabilidade possível, maior a possibilidade de perda. O risco é isso: tem chance de ganhar e tem muita chance de perder”, explica Thiago Godoy, educador financeiro da Rico.
Como mostrou o g1 nesta segunda-feira (13), Scarpa poderia ter rendimentos próximos de R$ 1 milhão ao ano com uma carteira de investimentos conservadora e bastante segura.
Mensagens de texto e de áudio revelam detalhes do golpe sofrido por Gustavo Scarpa
Rendimento muito acima do padrão
Dentro dos títulos de renda fixa, há três divisões principais e que costumam ter rentabilidade atrelada à Selic, à inflação pelo IPCA ou por uma taxa prefixada. Em todos, os juros pagos ao investidor não fogem do patamar dos juros básicos do país.
O Tesouro Selic ou títulos de renda fixa atrelados ao CDI rendem próximos à taxa básica de juros, hoje em 13,75% ao ano. Os títulos vinculados ao IPCA costumam pagar a inflação do período mais um extra de 6% a 8% — que também não passam dos 15%. Os prefixados também rondam esse degrau e pagam as taxas prometidas no momento de investir.
A única possibilidade de buscar taxas mais altas é partindo para a renda variável. Mas especialistas fazem questão de frisar que a rentabilidade anterior desses ativos não pode ser usada como garantia de algo similar no futuro. Ou seja: é possível que uma ação na bolsa, por exemplo, valorize 5% em um mês (ou 80% em um ano). Mas é impossível assegurar que fará o mesmo no ano seguinte.
“Isso pode acontecer durante um período, com uma ou outra empresa. Por isso que a gente sempre fala sobre a diversificação de investimentos: uma empresa que valoriza muito é ótimo, mas ela pode desvalorizar muito mais do que isso. Um exemplo muito recente disso é a Magazine Luiza”, explica o educador.
Um levantamento feito pelo Trademap mostra que os rendimentos nos últimos 12 meses das principais aplicações estão longe da cifra prometida no golpe. O g1 escolheu recortar a análise dentro da janela de 12 meses porque é o comparativo mais usual dentro do mercado.
O CDI, título emitido por instituições financeiras para equilibrar as operações entre os bancos, teve rentabilidade de 13,01% nos 12 meses terminados em fevereiro. A poupança também registrou rentabilidade positiva no período, de 8,18%.
Ativos que tiveram uma supervalorização são exceções no mercado. Um exemplo são os papéis da companhia Cielo, que valorizaram mais de 105% nos últimos 12 meses. Mas é a única ação do Ibovespa que valorizou acima do patamar prometido no caso do golpe contra os jogadores do Palmeiras. Além disso, a Cielo acumula queda de 2,63% em 2023.
Não bastasse, as empresas envolvidas no golpe prometiam rentabilidade após investimentos em criptomoedas. No último ano, contudo, o mercado cripto tem sofrido com a subida das taxas de juros ao redor do mundo, que aumenta a aversão a risco entre investidores e prejudica os ativos mais arrojados — o que é o caso. (veja mais abaixo)
A principal criptomoeda em circulação, o Bitcoin, teve rentabilidade negativa de 44,86% nos últimos 12 meses. Mesmo o HASH11, principal ETF de criptomoedas do Brasil e que simula a performance do mercado de cripto, caiu 43,16% no último ano. É um cenário de duplo prejuízo: uma empresa promete pagar 5% ao mês aos investidores, enquanto aplica em ativos que colhem prejuízos.
Esquema de criptomoeda: conversas indicam que o goleiro Weverton também perdeu dinheiro
Por que o mercado de renda variável está em alerta
Parte da explicação para esse mau momento dos ativos de renda variável é o reflexo do sentimento de aversão ao risco que tomou os mercados nos últimos anos. Ele é fruto principalmente da crise econômica decorrente das medidas restritivas da Covid-19 e foi intensificado com a guerra entre Rússia e Ucrânia.
Esse cenário se refletiu na subida de juros nas principais economias do mundo, principalmente dos Estados Unidos. O Federal Reserve (Fed) fez sucessivos aumentos ao longo de 2022 e a taxa de juros americana passou de 0,25% ao ano em janeiro de 2022 para o intervalo de 4,25% a 4,5% ao ano em dezembro.
Juros mais altos nos EUA elevam a atratividade de se investir na segura renda fixa norte-americana, o que tende a aumentar o ingresso de recursos na maior economia do mundo e tirar dinheiro de ativos de maior risco.
As cotações das moedas digitais têm por natureza uma variação muito intensa. E, além disso, também acompanham essa movimentação do mercado — e a queda de ativos de maior risco.

Fonte: G1