Ainda há caminhos que podem ser trilhados contra a crise do clima, diz candidata à presidência do IPCC
Se eleita, a matemática paulista Thelma Krug poderá ser a primeira mulher na chefia do painel da ONU, reconhecido mundialmente como a fonte mais confiável de informações sobre as mudanças do clima.
A cientista brasileira Thelma Krug poderá, em julho, fazer história no IPCC, o painel intergovernamental das Nações Unidas (ONU) reconhecido mundialmente como a fonte mais confiável de informações sobre as mudanças do clima.
A matemática paulista é candidata à presidência do painel, atualmente comandado pelo sul-coreano Hoesung Lee.
Se eleita, além de assumir a chefia do IPCC durante o ciclo de 2023 a 2028, Krug poderá ser a primeira mulher à frente da organização, que, além de Lee, teve mais três chefes desde a sua fundação em 1988 – todos homens e nenhum da América do Sul.
“O IPCC não gosta de ser catastrófico. Na verdade, a ciência mostra que você pode estar caminhando numa trajetória realmente catastrófica para o futuro, mas o outro lado da ciência também mostra que há caminhos que ainda podem ser trilhados, com enormes desafios, claro”, diz a especialista, fazendo referência às ações urgentes -e necessárias- de redução da emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.
Segundo os atuais cálculos do IPCC, precisamos reduzir as emissões globais pela metade até 2030 [48%] e até 99% até 2050 para que o aquecimento do planeta não ultrapasse o limite de 1,5°C até o fim do século.
A cientista, que já era vice-presidente do painel desde 2015, foi indicada pelo Ministério das Relações Exteriores para o cargo mais alto do órgão, dentro de um seleto grupo de representantes. Segundo ela, sua candidatura foi enviada nesta segunda-feira (10) ao secretariado do painel em Genebra.
Em uma nota interministerial, o governo federal confirmou a escolha para o processo. “A candidatura de uma cientista de renome reflete a prioridade que o Governo brasileiro confere aos esforços globais para combater a mudança do clima, tanto em adaptação como em mitigação, do que também é exemplo a candidatura da cidade de Belém, no Pará, para sediar a 30ª Conferência das Partes da UNFCCC (COP 30), em 2025″, informou o governo.
Sobre o processo de seleção, a matemática, que também trabalhou no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) por 37 anos, diz estar bastante animada, principalmente por incentivo do seu neto Luca, de 10 anos, um “autodidata da mudança do clima” que, segundo ela, foi seu maior estimulador.
“Ela falou para mim: ‘vó, acho que você deveria se candidatar porque você consegue fazer a diferença’. Então isso me tocou muito”, acrescenta.
“E eu acredito que posso aperfeiçoar as coisas que já funcionaram bem ao longo do último ciclo, como a comunicação do órgão, que melhorou muito e facilitou a compreensão por uma gama maior de interessados nessa temática”.
Se eleita, Krug também promete fazer mais presente discussões sobre gênero e diversidade dentro do painel, não apenas assegurando cada vez mais a participação de mulheres cientistas nas pesquisas, mas também estimulando o reconhecimento dessas pesquisadoras.
Como será a eleição?
A votação é secreta e acontecerá na 59ª Sessão Plenária do IPCC, a ser realizada em Nairóbi, no Quênia, de 24 a 28 de julho de 2023.
O processo de candidatura nomeação começou há pelo menos 10 dias e, além de Krug, outros três candidatos também estão inscritos, representando a África do Sul, do Reino Unido e da Bélgica.
As nomeações ainda não foram fechadas, e o IPCC ainda pode ter mais nomes em discussão para à presidência do próximo ciclo.
“E são todos excelentes candidatos. A competição será bastante acirrada”, afirma a cientista.
O painel tem 195 países membros e cada um tem um voto. Na sessão plenária, representantes de pelo menos 98 estados devem estar fisicamente presentes na sala para votar.
Vence aquele candidato que tiver pelo menos 50% dos votos. Se isso não ocorrer, novas rodadas de votação são realizadas com os dois candidatos mais votados. Se nesse segundo turno ambos tiverem o exato número de votos, os Estados membros são convidados a votar uma outra vez.
Se mesmo após essa terceira rodada não houver um concesso, um sorteio definirá entre os dois candidatos quem será o presidente do painel.
Quem é Thelma Krug?
Krug começou no IPCC em 2002, como co-presidente da Força-Tarefa sobre Inventários Nacionais de Gases de Efeito Estufa, projeto que ajudou a desenvolver.
A cientista possui graduação em matemática pela Roosevelt University e mestrado em Probabilidade pela mesma instituição.
Além disso, atuou como pesquisadora sênior no Inpe e como diretora do Departamento de Políticas para o Combate ao Desmatamento no Ministério do Meio Ambiente.
Também apoiou tecnicamente o Ministério das Relações Exteriores nas negociações de pelo menos 13 COPs, as conferências do clima da ONU, principalmente nos temas relacionados a florestas, uso da terra, inventários.
Perspectivas para a COP
Na última conferência do clima da ONU, a COP27, o documento final assinado pelos mais de 200 países-membros contemplou pela primeira vez na história uma resolução sobre um tipo de financiamento climático a países vulneráveis à crise do clima.
Chamado de perdas e danos, esse fundo era uma das questões-chave da cúpula do ano passado e uma demanda antiga de países em desenvolvimento.
Apesar de essa ser uma grande conquista apontada por especialistas, a COP 27 de Sharm El-Sheikh também foi tida como muito insuficiente em outros aspectos.
Por isso, o último relatório síntese do IPCC terá um papel fundamental na próxima cúpula da ONU, a ser realizada em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
Esta será a primeira conferência a analisar os esforços globais para reduzir as emissões desde o acordo de Paris, e incluirá petições de países mais pobres que pedem por mais ajuda.
Fonte: G1